Saiba como utilizar a ciência comportamental para transformar o desejo de doar em ações concretas.
Existe um abismo entre o que as pessoas querem fazer e o que elas realmente fazem.
É o nosso papel enquanto captadores de recursos, resolver esse problema e ajudar as pessoas a se tornarem melhores em doar e oferecer apoio às instituições do terceiro setor.
84% dos brasileiros realizaram alguma doação em 2022, de acordo com a Pesquisa Doação Brasil, e 88% da geração Z acredita que doar faz a diferença.
Então, como convertemos esses valores em contribuições para as nossas organizações?
De acordo com Bernard Ross, especialista em captação de recursos, há grandes oportunidades em converter esse desejo de fazer o bem em contribuições, uma vez que nos próximos 10 a 20 anos haverá a maior transferência de riqueza de uma geração, os baby boomers, para as próxima gerações, X e Y.
Muitos desses valores serão transferidos para os filhos ou sistema de saúde, mas parte dele poderia ser direcionado para a filantropia.
O especialista destaca também que vivemos um crescimento extraordinário da riqueza. Ou seja, os ricos estão ficando mais ricos. E, em muitos lugares, os pobres estão ficando mais pobres. Isso demonstra que há uma enorme riqueza pessoal crescendo.
Por isso, nós temos a responsabilidade de ajudar pessoas ricas a se tornarem mais filantrópicas, assim como as próprias pessoas ricas têm a responsabilidade de se tornarem mais filantrópicas para promover um equilíbrio no desenvolvimento da humanidade, da economia e do planeta.
Como difundir a cultura de doação?
O ponto que Bernard Ross aborda em sua aula A Ciência da Decisão para Aumentar o Impacto das estratégias de captação – disponível em nosso canal no Youtube – é que as estratégias que usamos hoje não são boas o suficiente para todo o impacto que precisamos alcançar.
Nesse sentido, precisamos de uma nova abordagem, com base em dados e na ciência comportamental, para compreender como as pessoas tomam decisões e como podemos ajudá-las a tomarem as melhores decisões filantrópicas.
Em sua aula, Bernard compartilhou insights preciosos sobre como as pessoas tomam decisões e como você pode orientá-las a fazer as melhores escolhas filantrópicas, passando pelos seguintes tópicos:
- Como criar mensagens atraentes e diretas para capturar a atenção do seu público.
- Entender como e por quê você e seus doadores são seres sociais e como isso pode influenciar as decisões.
- Utilizar elementos visuais para destacar informações cruciais e direcionar a atenção do doador.
- Como despertar emoções que impulsionam a ação e a doação.
- Contruir uma narrativa completa, com início, meio e fim, para manter o engajamento.
- Aproveitar o aumento natural do engajamento no fim das campanhas, utilizando a barra de progresso de arrecadação.
Teste do Ketchup
O “teste do ketchup” é uma metáfora que ilustra como a mudança no design de um produto pode melhorar significativamente a experiência do usuário.
Originalmente, os frascos de ketchup eram de vidro e exigiam que o usuário sacudisse ou batesse no fundo do frasco para que o produto saísse, muitas vezes com dificuldade e de maneira imprevisível. Isso causava frustração, pois o ketchup não fluía facilmente e, quando finalmente saía, muitas vezes vinha em excesso.
Com o tempo, o design dos frascos foi melhorado para atender melhor às necessidades dos consumidores. A introdução de frascos de plástico espremíveis com o bocal voltado para baixo permitiu que o ketchup fosse dispensado de maneira mais controlada e eficiente, praticamente eliminando o problema.
Essa analogia é usada para destacar a importância de pensar no design centrado no usuário ao desenvolver produtos ou estratégias. No contexto da captação de recursos, como mencionado no texto, isso significa criar processos que minimizem atritos e dificuldades, facilitando para que os doadores ajam conforme seus desejos e intenções.
O trabalho dos captadores de recursos é justamente esse: aplicar técnicas científicas para auxiliar as pessoas a alinharem seus desejos e seu comportamento, sua vontade de fazer o bem com as nossas causas que precisam de recursos para ampliar o impacto.
Neurociência e o princípio da reciprocidade
A neurociência revela que a parte do nosso cérebro que se ativa quando presenteamos alguém é a mesma que se acende quando recebemos um presente. Essa área, conhecida como o sistema de recompensa, envolve a liberação de neurotransmissores como a dopamina, que nos proporciona sensações de prazer e satisfação.
Essa descoberta é fascinante porque nos ajuda a entender melhor o princípio da reciprocidade, um dos pilares das interações humanas.
Quando presenteamos alguém, não apenas criamos uma conexão emocional com a pessoa, mas também desencadeamos um ciclo de reciprocidade. A ciência mostra que nosso cérebro é programado para sentir prazer tanto em dar quanto em receber, o que reforça comportamentos sociais positivos, como a generosidade e a cooperação.
Esse fenômeno explica por que as pessoas sentem uma necessidade natural de retribuir favores e presentes. Quando recebemos algo, nosso cérebro reconhece o gesto e gera um impulso para devolver essa ação positiva, fortalecendo laços sociais e promovendo a harmonia nas relações.
No contexto da captação de recursos, compreender essa dinâmica pode ser extremamente útil para criar campanhas que incentivem doadores a contribuir de forma mais engajada e repetida.
Psicologia evolutiva e a ciência comportamental
A psicologia evolutiva, um campo amplamente estudado dentro da ciência comportamental, nos ajuda a entender que o cérebro humano, com mais de 200.000 anos de evolução, ainda carrega traços funcionais herdados dos nossos antepassados.
Esses traços, que foram essenciais para a sobrevivência em tempos pré-históricos, continuam a influenciar nossas decisões e comportamentos nos dias de hoje.
Bernard Ross destaca que uma das lições mais importantes que aprendemos ao longo da evolução foi evitar de riscos. Essa tendência está profundamente enraizada em nossa natureza, pois evitá-los aumentava as chances de sobrevivência em ambientes hostis e desconhecidos.
No contexto moderno, essa aversão ao risco ainda molda muitas de nossas escolhas, especialmente em situações que envolvem incertezas, como decisões financeiras ou filantrópicas.
A ciência comportamental nos mostra que, ao entender esses padrões, podemos desenvolver estratégias mais eficazes para ajudar as pessoas a tomar decisões que estejam alinhadas com seus valores e desejos de contribuir para causas sociais, minimizando as barreiras percebidas e os medos associados ao ato de doar.
Essas compreensões são fundamentais para criar campanhas de captação de recursos que não apenas respeitam, mas também trabalham com esses instintos evolutivos, tornando o processo de doação mais seguro e atraente para os doadores.
Economia comportamental e captação de recursos
A economia comportamental é um campo de estudo que investiga como as pessoas tomam decisões econômicas, especialmente em situações que envolvem incerteza e risco.
Diferente da economia tradicional, que assume que os indivíduos são sempre racionais e buscam maximizar seus benefícios, a economia comportamental considera que as decisões são frequentemente influenciadas por fatores emocionais, cognitivos e sociais, que podem levar a comportamentos aparentemente ilógicos.
Esse campo é particularmente relevante para a captação de recursos, pois nos ajuda a entender como os doadores reagem a diferentes estímulos e como essas reações influenciam suas decisões de doar ou não. A ciência comportamental mostra que as decisões humanas são guiadas por dois sistemas principais:
Segundo Bernard Ross, um dos grandes desafios nas estratégias de captação de recursos é que muitas vezes tentamos persuadir os doadores a partir de argumentos racionais e lógicos, ativando o Sistema 2.
No entanto, as pessoas tendem a tomar decisões de doação com base em emoções e instintos, ou seja, utilizando o Sistema 1.
Isso significa que a chave para aumentar a eficácia das campanhas de captação pode estar em desenvolver estratégias que ativem o Sistema 1, tornando o ato de doar uma decisão rápida, intuitiva e emocionalmente satisfatória.
Ao aplicar os princípios da economia comportamental, é possível criar campanhas que reduzam os atritos no processo de doação, como formulários complexos ou etapas excessivas, e que utilizem gatilhos emocionais e sociais para incentivar a doação.
Dessa forma, as organizações podem alinhar suas abordagens com a maneira como os doadores realmente tomam decisões, aumentando a probabilidade de sucesso nas suas campanhas de captação.
Simplificando a tomada de decisão para os doadores
A chave para aumentar a eficácia das suas campanhas de captação de recursos é tornar a tomada de decisão o mais simples e direta possível. Ao criar um caminho descomplicado para os doadores, você minimiza as barreiras e facilita o ato de doar, aumentando as chances de conversão e fidelização.
Reduzindo o atrito na jornada de doação
Um dos principais fatores que influenciam a decisão de doar é o nível de complexidade do processo.
Formulários longos e etapas excessivas podem desmotivar os doadores, especialmente aqueles que estão fazendo sua primeira doação. Portanto, é essencial encurtar os caminhos, observando o comportamento dos seus doadores e ajustando a experiência de doação para ser o mais fluida e intuitiva possível.
Algumas opções práticas:
- Formulários simples: Evite pedir muitas informações no primeiro contato. Concentre-se apenas no essencial para concluir a doação.
- Redução de etapas: Minimize o número de cliques e etapas necessárias para finalizar a doação. Quanto mais rápido o doador puder completar o processo, maior a probabilidade de ele concluir a doação.
- Testes de usabilidade: Observe como seus doadores interagem com a página de doação. Identifique pontos de atrito e simplifique-os para melhorar a experiência do usuário.
A arte de oferecer opções de doação
Ao oferecer diferentes opções de doação, é importante considerar a forma como as escolhas são apresentadas.
Muitas vezes, as organizações e empresas posicionam a “melhor opção” no meio de três alternativas.
Isso ocorre porque as pessoas geralmente evitam extremos, preferindo escolher uma opção intermediária que parece mais segura e razoável.
Aversão a extremos
Psicologicamente, tendemos a evitar escolhas que parecem excessivas, seja por serem muito baratas e simples ou muito caras e sofisticadas. A opção intermediária oferece um equilíbrio, sendo percebida como uma escolha “inteligente” e prática.
Decisão facilitada
Ao posicionar a opção mais vantajosa no meio, você facilita a decisão do doador, que rapidamente identifica essa escolha como a melhor em termos de valor e impacto.
Somos todos seres sociais
A natureza social dos seres humanos desempenha um papel crucial em como interagimos e tomamos decisões, especialmente em relação a causas e doações.
Como seres sociais, somos fortemente influenciados pelas ações e comportamentos das pessoas ao nosso redor. Isso ocorre porque, desde os tempos mais remotos, aprender e seguir as normas do grupo tem sido uma estratégia essencial para a sobrevivência e o bem-estar.
Quando se trata de captação de recursos, essa inclinação social pode ser um poderoso aliado.
Mostrar que há pessoas envolvidas tanto na promoção quanto no impacto da causa é uma maneira eficaz de criar uma conexão emocional e motivar mais indivíduos a se engajarem. O comportamento de doação pode se tornar contagiante; ao ver outros doando, as pessoas sentem-se inspiradas a fazer o mesmo, pois desejam participar de algo maior e contribuir para uma causa compartilhada.
Grupos e comunidades funcionam como amplificadores desse comportamento social. Quando doadores veem que estão fazendo parte de uma comunidade, que seus esforços estão alinhados com os de outros, e que há reconhecimento por suas contribuições, o sentimento de pertencimento se fortalece. Isso, por sua vez, incentiva mais doações e um maior envolvimento com a causa.
Um excelente exemplo disso é a organização Onçafari, que utiliza “selos doadores” para cada faixa de valor de doação. Esses selos não apenas reconhecem a contribuição do doador, mas também criam um senso de identidade dentro da comunidade de apoiadores. Ao escolher um selo, o doador se sente parte de um grupo que compartilha os mesmos valores e objetivos, reforçando o ciclo de doação e engajamento social.
Estímulos visuais e respostas emocionais
O primeiro passo para engajar potenciais doadores é despertar uma resposta emocional.
Sentimentos são poderosos motivadores de comportamento, e eles frequentemente precedem qualquer análise racional que possa justificar uma decisão. Em outras palavras, é o coração que decide primeiro; a mente só procura razões para justificar a escolha posteriormente.
Histórias bem contadas desempenham um papel crucial nesse processo, pois elas têm o poder de tocar emoções profundas e criar empatia. Quando uma pessoa se identifica emocionalmente com uma causa, ela se sente mais inclinada a agir, seja fazendo uma doação, compartilhando a mensagem ou se envolvendo de outras formas.
Um exemplo eficaz de como utilizar esse princípio pode ser encontrado também nas comunicações do Onçafari. Os doadores podem acompanhar o progresso das onças monitoradas pela organização, o que não só personaliza a experiência de doação, mas também reforça a conexão emocional.
Ver o impacto tangível de suas doações em tempo real gera um sentimento de satisfação e realização, incentivando a continuidade do apoio.
Essas dicas visuais, como fotos e atualizações regulares sobre o impacto da doação, atuam como gatilhos emocionais que tornam a experiência do doador mais rica e gratificante. Elas ajudam a solidificar a relação entre o doador e a causa, promovendo um ciclo de doações recorrentes e um apoio mais engajado.
Conclusão
Ao integrar a ciência comportamental nas estratégias de captação de recursos, conseguimos alinhar os desejos e intenções dos doadores com ações concretas que realmente fazem a diferença. Compreender como os doadores tomam decisões, e como podemos influenciar essas escolhas, é essencial para maximizar o impacto das campanhas filantrópicas.
Aplicar técnicas que simplifiquem a jornada de doação, ativem respostas emocionais e reconheçam a natureza social do ser humano, permite que as organizações do terceiro setor não apenas alcancem seus objetivos financeiros, mas também fortaleçam os laços com seus doadores, criando uma comunidade de apoio engajada e duradoura.
Quer saber mais? Assista à aula completa do Bernard Ross e baixe os materiais complementares para começar a aplicar esses insights na prática e potencializar suas estratégias de captação.